domingo, 16 de dezembro de 2012


FES e a Prática Clínica


Atualmente a estimulação elétrica funcional (FES) é uma técnica de intervenção utilizada em utentes com lesões neurológicas, com paresia ou paralisia, sendo comumente utilizada em utente com lesão do moto-neurónio superior.
No início da FES, esta foi caracterizada pela técnica que permitia obter um movimento muscular imediato funcional em resposta a um estímulo elétrico. A principal aplicação era na correção do pé pendente, contudo, era de difícil acesso pois a produção do estímulo era feita através de bobinas, que não era possível deslocar. Em 1960, surgiram os primeiros estimuladores portáteis, o que permitiu uma correção na marcha de um utente hemiplégico, segundo uma otimização dos aparelhos pelo Dr. Liberson e pelo Dr. Franklin Offner. De seguida produziram uns estimuladores que permitia a utentes paraplégicos, realizar marcha, pela estimulação do músculo Glúteo Máximo e do  músculo Solhar. Toda a evolução da aplicação de FES surgiu devido ao trabalho de Dr. Liberson e colegas baseando-se na engenharia médica, na biológica, na tecnologia, na cibernética e na neurofisiologia. Esta evolução permitiu que a prática clínica se fosse adaptando as disfunções do moto-neurónio superior e inferior que iam surgindo ao longo do tempo. A aplicação da FES foi melhorando até a década de 70, onde foram reconhecidas, através de diversos estudos, as influências nas disfunções dos moto-neurónios superiores e inferiores nas características tróficas do músculos e na excitabilidade neural.
Desde o início da FES, houve a definição de parâmetros seguros para a sua utilização e evolução na sua aplicação como estratégia de intervenção. Sendo que houve grandes evoluções nas tecnologias de implante e aplicação, o que permite, de certa forma, um uso continuado por parte do utente sem grande dificuldade. Contudo não podemos esquecer que a prática clínica atualmente baseia-se nos mesmos princípios que no início da FES, apenas está melhorada pelos estudos que comprovam a sua efetividade. A prática clinica atual demonstra que o uso precoce da FES pode minimizar os efeitos do desuso, que surgem nas diversas lesões neurológicas, podendo acompanhar de forma mais eficaz a recuperação e a neuroplasticidade inerente. Com a evolução da neurociência, a aplicação da FES, atualmente, baseia-se nos conhecimentos sobre os geradores de movimento, de controlo, no processamento de informação e o modo de condução da informação no sistema nervoso, o que permite uma melhor adequação ao utente.
Podemos concluir que os princípios da FES fornecem atualmente, a prática clinica, a capacidade de corrigir uma falha neuromuscular que surja de uma lesão no sistema nervoso. Sendo assim, a junção de conhecimento sobre o controlo motor do ser humano ao longo de décadas permitiu, uma evolução lenta, de uma estratégia eficaz em situações neurológicas.



Referência bibliográfica:

Dimitrijevic, M. R. (2008). Clinical Practice of Functional Electrical Stimulation: From “Yesterday” to “Today”. Artificial Organs, 32(8), 577–580.






sábado, 8 de dezembro de 2012


FES induzido com Bicicleta melhora a locomoção em utentes que sofreram AVC isquémico em fase pós-aguda (RCT)
 
Imagem 1- FES-cycling
A recuperação da marcha é considerada um dos objetivos principais na reabilitação do membro inferior após Acidente Vascular Cerebral (AVC).

Desde 1990 o uso da Estimulação Elétrica Funcional (FES) tem vindo a aumentar na reabilitação da marcha após AVC dando alguma evidência acerca da sua eficácia na recuperação motora e na melhoria da marcha.

Uma alternativa ao FES induzido (FES-induced) com Treino de Marcha é o uso de FES sincronizado com Bicicleta (FES-cycling), o que implica uma ativação coordenada dos músculos do membro inferior, aproximada aos movimentos cíclicos da marcha. A viabilidade do treino de FES induzido com Bicicleta (FES-cycling) em utentes com AVC em fases pós-aguda e crónica foi recentemente demonstrada. Estes estudos sugerem que o FES-Bicicleta (FES-cycling) é efetivo na melhoria da força muscular, na suavidade do movimento de pedalar e no pico máximo de pedalar.

Com este estudo coloca-se uma questão fundamental: será que o Treino de FES mediado numa bicicleta (FES-cycling) se consegue transferir para a locomoção? Devido às similaridades entre o movimento de pedalar e a marcha bem como da estimulação aferente-eferente fornecida pelo FES pode-se colocar a hipótese de que o FES induzido com Bicicleta (FES-cycling) aplicado numa fase pós-aguda pode desempenhar um papel fundamental na promoção da recuperação motora e melhoraria da locomoção. Esta hipótese foi recentemente demonstrada por um RCT cujos resultados suportam fortemente que um tratamento de 4 semanas de FES induzido com Bicicleta (FES-cycling) melhora a recuperação motora e a habilidade para a marcha em utentes hemiparéticos na fase pós-aguda.  

Imagem 2- FES-cycling
Este RCT apresenta uma análise de um subgrupo de 20 pacientes que foram diagnosticados com 1º AVC isquémico (sendo que esta é a principal causa da hemiparesia) há menos de 6 meses antes do início do estudo focando-se nos benefícios alcançados na performance na bicicleta e velocidade de marcha. Critérios de inclusão adicionais eram: apresentar um nível de cognição que permitisse realizar uma reabilitação padrão, capacidade para sentar-se até 30 minutos, amplitudes articulares que permitissem o movimento de pedalar e espasticidade baixa nos músculos do membro inferior (Escala de Ashworth Modificada <2). Como critérios de exclusão tinha: pacemakers cardíacos, alergia aos elétrodos, e incapacidade para tolerar a estimulação.   
Os participantes foram randomizados em 2 grupos realizando treino de bicicleta sincronizado com FES (grupo FES) ou Treino passivo de Bicicleta com FES placebo (grupo placebo). O tratamento consistiu em 20 sessões de 25 minutos cada.

Os pacientes foram avaliados antes do treino, após o treino e, a 3 e 5 meses para follow-up através de um Teste de Bicicleta e um Teste de Marcha de 50 metros.

Comparando os resultados obtidos em toda a população de pacientes incluída no estudo anterior aos resultados do subgrupo deste estudo foi possível demonstrar que o treino de FES-bicicleta (FES-cycling) é particularmente efetivo na capacidade de melhorar a habilidade de marcha e de pedalar em utentes com diagnóstico de AVC isquémico na fase pós-aguda. De fato, foi encontrada uma diferença significativa entre os grupos em favor dos pacientes tratados com FES, apesar de esta evidência ter sido mais clara em follow-up. Além disso, a análise do Teste de Bicicleta permitiu investigar os mecanismos que contribuíam para tal melhoria na marcha: o aumento do trabalho produzido pelo quadricípite parético e a melhoria em termos do equilíbrio de trabalho entre os quadricípites não-parético e parético que demonstraram um fortalecimento da perna parética o que fez com que os utentes andassem mais rapidamente.

Artigo: Ambrosini, E. Ferrante, S. Molteni, F. Ferrigno, G. Pedrocchi, A. (2011) FES-induced Cycling Improves Locomotion in Post-Acute Ischemic Stroke Patients: a Randomized Controlled Trial. 16th Annual Conference of the International Functional Electrical Stimulation Society. :017.


domingo, 2 de dezembro de 2012


Influência da estimulação elétrica funcional (EEF) no tónus muscular e controle postural nos hemiplégicos após AVC.



No processo de reabilitação funcional em utentes hemiplégicos temos que considerar as alterações posturais, encurtamentos musculares e alterações dos padrões de movimentos. Mudanças morfológicas, fisiológicas e biomecânicas dos músculos (DEAN et al 2000) podem contribuir a diminuição da amplitude de movimento, causar dor e contraturas, como, também dificuldades funcionais.
A reabilitação das funções motoras passa pela Facilitação Neuromuscular Proprioceptiva e o método Neuro-Evolutivo. No processo da neuro reabilitação existem ainda aparelhos de estimulação eléctrica para diversas finalidades: alívio da dor, fortalecimento muscular, aumento da resistência, diminuição da espasticidade, aquisição ou manutenção de amplitude de movimento e para produção de movimentos funcionais (WANG, J & STELMACH apud OBERG, 2002).

A Estimulação Elétrica Funcional (EEF) utiliza a corrente elétrica para provocar a contração de músculos paralisados ou enfraquecidos decorrentes de lesão do neurônio motor superior.
- Os efeitos imediatos são: inibição recíproca, relaxamento do músculo espástico e estimulação sensorial de vias aferentes.
- Os efeitos tardios agem na neuroplasticidade e são susceptíveis de modificar as propriedades viscoelásticas musculares e favorecer a ação e o desenvolvimento de unidades motoras de contracção rápida.
No entanto, a sua aplicação é limitada por certos critérios de exclusão como alterações tróficas no local da aplicação da EEF, Diabetes Mellitus avançada, alterações cognitivas importantes e outras doenças neurológicas associadas.
O tratamento fisioterapêutico, integrado num conjunto de intervenções, baseia-se então em restaurar as habilidades funcionais desses indivíduos através do processo de aprendizagem ativa do indivíduo (RICHARDSON, 2002; STOKES,2000). A utilização da EEF no membro superior de indivíduos que sofreram AVC tem como princípio realizar movimentos funcionais como alcance e preensão de um objecto, consequentemente reduzindo a espasticidade (SULLIVAN, 2005) e melhorando o controlo motor selectivo na função do alcance e preensão (SHUMWAY-COOK, 2003),havendo assim, o recondicionamento do ato motor associado à percepção.
Sendo que os sistemas, sensorial e motor trabalham em conjunto para a coordenação de movimento através de uma sequência correta de activação entre os músculos sinergistas, agonistas e antagonistas, o mecanismo da terapia com a EEF é que caminhos motores alternativos são recrutados e ativados para ajudar nos caminhos eferentes danificados (ROBY-BRAMI 1997).

Estudos mostram que a EEF pode ser aplicada diariamente (CHAE, J. Et al, 1998) e por um período de até seis meses (CAURAUGH, J et al, 2000). O programa com duas sessões semanais durante três meses com duração de 20 minutos cada sessão sendo uma média de tempo utilizada em diversos estudos (OBERG, 2002) mostrou-se viável, visto que os resultados alcançados foram positivos.
A recuperação da força isométrica e a redução das desabilidades dos membros superiores dos hemiplégicos (POWELL, 1999), bem como a recuperação da força muscular e da coordenação motora, mostram que a combinação da estimulação eléctrica com o esforço voluntário promove e mantém a recuperação funcional.


Miyazaki, E., Rosa, T., Nascimente, A. & Oberg, T. (2008) Influencia da estimulação electrica para adequação de tono muscular e controle motor em hemiplégicos. INTELLECTUS – Revista Academica digital do Grupo POLIS Educacional – ISSN (5), 1679 – 8902.